Há sempre duas coisas que acontecem quando alguém me pergunta qual é o meu trabalho. Uma delas é responder “locutor” e franzirem a sobrancelha, sem perceberem muito bem do que se trata. Lá explico que faço voz-off para anúncios de publicidade na televisão ou na rádio, que sou uma das vozes que se ouvem em atendimentos telefónicas, elearning e audio-livros. E daí surge a típica segunda situação: perguntam-me se consigo viver disso…
Foquemo-nos na primeira questão desta vez. (Mas sim, consigo viver disto!)
De facto, nem as Finanças têm uma categoria profissional que se encaixe perfeitamente no que faço. Com as 1001 carreiras em menus “dropdown” de formulários online nem se fala.
Devo ser um pária laboral, pá!
Locutor continua a ser o termo com o qual me apresento. Faço locuções. E mesmo lá fora, na anglofonia, onde a carreira de “Voice-over” está muito mais consagrada – há muitas associações, congressos, estudos, e prémios anuais glamorosos, que nem os Óscares -, não há um consenso sobre como cada um se deve apresentar. Os dicionários mais conceituados falam em “voice-over” mas o termo mais usado na classe é “voiceover”. Há quem opte pela solução intermédia de “voice over”. Há quem seja mais preciso e se apresente como “voice actor” ou “voice artist” ou “voice talent”. Há quem não se poupe em palavras e diga que é “voiceover talent”. E há quem seja contido e diga apenas “VO”. Se espreitar o mundo francófono ainda atiro mais achas para a fogueira. Por lá, os meus colegas apresentam-se como “comédien voix-off”.
Não sou ator. Duvido que seja artista. Dizer talento soa a arrogante. E ver-me como comediante de voz… Talvez não seja boa ideia adaptar terminologias estrangeiras.
Enfim, sou o que sou, diz que disse.
E já cá não está quem falou.